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ARTIGOS: Filosofia da Ciência




A Visão Humana de Natureza & Ficção Científica

No Nada aparece uma coisa: uma coisa qualquer. Uma segunda coisa aparece. A Segunda Coisa, então, passa a tentar identificar a coisa que havia anterior ao seu surgimento – a “coisa qualquer”. Após atribuir determinada identificação, a Segunda Coisa percebe que surge, então, uma terceira coisa e assim, também a identifica. Dessa maneira, sucessivas coisas foram e vão aparecendo e a Segunda Coisa foi e vai identificando-as, além de, agora, também classificá-las e relacioná-las. O Nada passa, aos poucos, a ter de tudo; passa a ser o Tudo – um Tudo sem limites; um Tudo cujo domínio abriga duas naturezas: a natureza da Natureza que origina as coisas e a natureza criada pela identificação, classificação e importância atribuída às coisas pela Segunda Coisa. Mas, o quê são tais coisas? O quê é a Segunda Coisa?

Pelas relações estabelecidas acima é possível visualizar a maneira com a qual o ser humano, a Segunda Coisa, veio e vem desvendando o ambiente, a Natureza, e como se deu e se dá, conseqüentemente, a interpretação da natureza e funções de tudo que a compõe.

A curiosidade antes era soberana quanto ao direcionar o homem ao buscar/querer saber mais, entretanto, o mundo contemporâneo elege as próprias necessidades humanas como potenciais forças que o direcionam ao tal buscar/querer saber mais. Embora haja essa divergência, ambas as “vertentes” do ganhar conhecimento propiciam o surgimento de mais definições e interpretações acerca das coisas.

Mas e o Nada? E o Tudo? Em meio à busca pelo sanar as necessidades humanas, a Ciência deixou de ser neutra. Ou movida pelas necessidades e desejos do o que ter, ou movida pelas necessidades do como estar em sociedade, ela aliou-se fortemente ao sistema capitalista, união essa que, de acordo com as influências de tal sistema sobre as sociedades, moldando e modelando-as, conforme apresentado por Anthony Giddens em sua obra “As Conseqüências da Modernidade” (1991), ilustra uma Natureza que ao longo das revoluções industriais foi tida exclusivamente como fonte de recursos naturais necessários à produção em larga escala de bens de consumo, de máquinas e de esperanças quando em períodos de guerra.

O Tudo da Natureza passou a ser minuciosamente analisado em prol da busca por materiais úteis às necessidades sociais, materiais esses que compreendem desde elementos químicos até seres vivos. Quanto ao Nada, atualmente inexistente quanto às descobertas e ao processo de se fazer Ciência, ele ilustra o perturbado, deturpado, conhecimento que o homem diz ter face à origem da Vida, à sua própria origem, à sua própria natureza.

A verdade é que cortamos nosso cordão umbilical. Deixamos de lado a nossa ligação com a natureza da real Natureza, aquela natureza que origina as coisas, para traçarmos sobre tal as nossas inúmeras perturbações ambientais, fruto de nossas necessidades também inúmeras; fruto do nosso “desenvolvimento”.

Precisamos nos enxergar novamente como parte da Natureza, como seres vivos tão naturais como qualquer outro ser, para que assim possamos fazer digno uso de nossa racionalidade, ou seja, para que assim possamos usar nossa racionalidade em prol da preservação das outras espécies;da vida, do planeta e, conseqüentemente, de nós mesmos.

Dessa maneira, temos que somos nós mesmos, criadores de uma natureza humanizada e de uma natureza antropocêntrica, os únicos seres vivos que tentam compreender a Natureza para posteriormente tentar dominá-la. O buscar conhecimentos, o buscar conhecer, anteriormente mencionado, encontra-se camuflado sob a dimensão do ter poder, do reter força, assim, almeja-se conhecer/conseguir mais coisas para poder controlá-las, configurando assim um status de maior poder. Devido a essa realidade, vemos que face às intempéries naturais, o ser humano logo menciona serem revoltas da Natureza, contribuindo ainda mais para o seu afastamento da mesma, para o seu desejo de controlá-la para tentar torná-la mais afetuosa.

Somos parcelas do todo, do Tudo. Somos a Segunda Coisa em meio a tantas outras coisas. A Natureza, por meio das “intempéries”, usa-se das mais diversas “técnicas” para cicatrizar as feridas que foram causadas por nós mesmos; para se curar de nós. Somos seres vivos que prejudicam a Natureza, então, naturalmente, seremos responsabilizados por isso, estaremos sujeitos às alterações na dinâmica do planeta que foram causadas por nossas interferências não claras, não bem planejadas, na biosfera,sendo essas conseqüências dignas de virarem filmes de ficção-científica!

Uma “revolta” da natureza como vulcões em intensa erupção, ameaçando cidades como nunca antes havia sido registrado, aliens que chegam em caravanas intergalácticas para fazerem um piquenique com humanos, máquinas que se revoltam, clones descontrolados, neurotoxinas liberadas pelas plantas ao vento e em escala global ou mesmo algo semelhante ao aquecimento global, à gripe suína e ao vazamento de petróleo nos EUA, retratam o quanto a ficção-científica propicia uma aproximação do imaginário humano às reais dimensões das forças da Natureza.

A ficção-científica, então, aproxima a Ciência de problemas que precisam ser solucionados para que seja assegurado o bem-estar do viver humano, da vida. Assim, ela pode ser compreendida como uma medida provisória às surpresas que, eventualmente, a Natureza venha, ainda, a nos revelar. E o que é a ficção-científica senão fruto daquele nosso espírito observador, antes já mencionado? Dessa maneira, estamos nos retendo em não enxergar a Natureza com outros olhos. Estamos poupando a nossa subjetividade e criatividade, dificultando, assim, uma nova releitura científica do mundo.

Entretanto, quando se tem uma Ciência vinculada a meios de divulgação que atinjam grande público (como revistas e cinema), temos a elaboração de uma Ciência para leigos, de uma Ciência acessível a todos. Assim, a ficção-científica, quando também vinculada a tais meios de divulgação, faz com que as pessoas associem o ficcional ao científico, expondo suas interpretações, sua criatividade, suas criticas, dando bases para o surgimento de novas idéias que possam ser úteis ao desenvolvimento de pesquisas em inúmeros temas e assuntos, que contribuam para a solução de problemas humanos, da Natureza.

Assim, espera-se que se estabeleçam novas necessidades humanas: a de compartilhar informações bem traçadas, bem argumentadas e a necessidade do ser humano em se auto-re-enxergar, pontuando de maneira sincera consigo mesmo, com sua espécie, quais atos devem ser repensados, mudados, quais ideias devem ser mais bem refletidas e o que fazer daqui para frente com a vida deste planeta, pois a Natureza não é nossa inimiga e assim nem deve ser imaginada, além do que, nós é que não somos os “bonzinhos” dessa história. Somos apenas a Segunda Coisa.

Artur Rodrigues Janeiro – 4º ano Ciências Biológicas (Noturno)







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