Bioética em Cirurgias Plásticas

Paloma dos Anjos Leopoldino Oliveira, Bianca da Costa Santos, Bárbara Zaitun Gomes Faustino, Júlia Marcelly Prates – graduandas em Ciências Biológicas, UNESP-Rio Claro

A preocupação com a estética não é privilégio da nossa era pós-moderna. As cirurgias plásticas – como especialidade médica oficial – passou a existir durante a primeira guerra mundial, pois com a deformação dos soldados - decorrentes dos acidentes de guerra - criou-se uma demanda enorme de reconstruções e reparações estéticas. Mais tarde, com o desenvolvimento dos meios de comunicação de massa, as mídias tornaram-se referências de estilos de vida: ditam como devemos vivê-la, padronizam-na e fazem muitos acreditarem que a felicidade é dependente desse padrão.

Um exemplo disso? Quando foram criados os comerciais - principalmente em épocas de Primeira e Segunda Guerras Mundiais - obteve-se um poder de persuasão e de designar novos comportamentos. Sabendo disso, a mídia tem sido usada para controlar os protótipos estéticos como uma mercadoria, visando principalmente o lucro que a padronização da beleza pode gerar.

Neste contexto, de acordo com o site G1 (http://g1.globo.com/profissao-reporter/noticia/2015/06/brasil-e-recordista-mundial-com-15-milhao-de-cirurgias-plasticas-ao-ano.html), em 2013 - pela primeira vez - o Brasil superou os Estados Unidos e se tornou líder mundial na realização de procedimentos cirúrgicos estéticos; dentro das intervenções mais realizadas, em 2014, estão: lipoaspiração (217. 606), aumento de mama por prótese de silicone (185.042), blefaroplastia (levantamento das pálpebras) (161.235), abdominoplastia (121.884) e enxerto de gordura (112.306).

Mas, o que essa realidade tem a ver com a Bioética? Bem, para responder a essa pergunta é necessário caracterizar o que significa Bioética. Dificilmente esse conceito será achado em dicionários habituais, pois está associado a um contexto relativamente novo. Cilene Rennó Junqueira, da UNIFESP, explica que o termo Bioética foi empregado em 1970, pelo bioquímico e oncologista americano Van Rensselaer, referindo-se à importância das ciências biológicas na melhoria da qualidade de vida, ou seja, para ele, Bioética seria a ciência que garantiria a sobrevivência no planeta.

A Revista Bioética afirma, por sua vez, que a Bioética possui como objetivo facilitar a solução e o enfrentamento de problemáticas éticas e/ou bioéticas que surgirão na vida do profissional. Esses conceitos básicos o ajudam a enfrentar dilemas, conflitos e se posicionar de maneira ética em situações cotidianas de quem escolheu esta carreira. Sendo assim, o papel da Bioética não é o de aplicar regras comportamentais (que não funcionam como as leis!), mas auxiliar as pessoas a saberem como se portar diante de diversas problemáticas éticas na vida profissional. No caso da ética médica, por exemplo, esta deve avaliar os aspectos éticos referentes à medicina, levando em consideração os atos praticados por esses profissionais.

De acordo com Joaquim Clotet, em O Porquê da Bioética, houve vários motivos para a criação deste termo, destacando principalmente a necessidade de um padrão moral que possa ser compartilhado por pessoas com morais diferenciadas. Essa é uma constatação de que vivemos, no âmbito mundial, uma fragmentação moral e, desta forma, fez-se necessário estabelecer princípios básicos e comuns para que se resolvam problemas também comuns, aplicados às áreas biomédicas.

Já no âmbito das mídias, são conhecidos inúmeros casos de cirurgias plásticas que deram errado, casos problemáticos com médicos formados e com autorização para exercer a profissão. Notícias no site da UOL, mostram exemplos, tais como o caso da Linda Perez de 19 anos, que ficou com o corpo paralisado e se tornou quase muda após a realização de implantes para aumentar os seios. Sua cirurgia foi realizada por um médico com o currículo impecável e de “ficha limpa”, de acordo com o Departamento de Saúde da Flórida.

É claro que acidentes podem acontecer; Mas, antes de um paciente passar por qualquer procedimento cirúrgico, ele deve ser informado acerca dos riscos. Se os cirurgiões plásticos agissem dessa forma na prática das cirurgias, muitos acidentes poderiam ser evitados. Sabendo disso, é possível chegar na maior problemática do tema: Até onde o médico cirurgião deve chegar para atender os desejos de uma paciente?

Muitos médicos que, teoricamente, cumprem de forma comprometida o conceito básico esclarecido no código bioético, rejeitam casos em que sabem que o paciente poderá passar por maiores riscos. Outros, entretanto, menos interessados no código ético e mais interessados no retorno financeiro (já que um implante de silicone custa, em média, 8 mil reais e uma rinoplastia, 5 mil, aceitam qualquer paciente, independentemente dos riscos que podem ser gerados durante e após a cirurgia. Vale lembrar que problemas cardíacos ou respiratórios e mesmo fatores genéticos podem ser uma das causas de acidentes durante os procedimentos de cirurgia plástica, mesmo quando esses são considerados simples.

Por outro lado, os pacientes também possuem sua responsabilidade quando se trata dessa temática. A individualização do paciente: até onde os pacientes possuem o direito de escolha do que se pode ou não fazer consigo mesmo? Procurar médicos mais baratos e menos confiáveis ao invés do contrário. Fazer cirurgias mesmo com a recomendação negativa de um bom profissional para realizá-la: até quando a individualização está correta?

O individualismo é uma modalidade que exerce grande influência na reflexão do código ético, como um lado “negativado” da criação desse código. O individualismo, brutalmente falando, propõe que a atitude mais importante para tomarmos uma decisão seja a reivindicação da liberdade, expressa na garantia incondicional dos espaços individuais. A liberdade é um bem moral a ser defendido, porém neste caso, a liberdade que se resume à busca de uma independência total.

Essa independência não pode ser possível, pois envolvem seres sociais contidos numa sociedade de regras, condutas e dependentes de vínculos sociais. Essas relações impõem consequências e responsabilidades individuais em relação ao meio. Não há liberdade sem responsabilidade. Quando um paciente decide acima de tudo e todos que pretende fazer uma cirurgia plástica mesmo com a negativa do médico, ele está passando sua liberdade acima da liberdade de outrem, no caso, o médico profissional. Dessa forma, o paciente responsabiliza não somente ele, mas principalmente o médico por seus atos e escolhas.

Manter o individualismo e toda sua liberdade por trás disso é importante. A vontade de realizar cirurgias plásticas, sendo por estética ou por motivos mais graves como as reconstruções após um acidente, por exemplo, deve ser levada em conta, contudo, com a conscientização dos riscos e da probabilidade de que essa operação não possa ser realizada, com a procura de mais de uma opinião profissional, com a escolha de um bom médico e com o pensamento de que nem sempre o mais barato compensa, muitos acidentes, mortes e operações falhas seriam evitadas. Médicos que não seguem seu código ético pré-estabelecido, não poderá realizar uma operação de risco sem a autorização do próprio paciente.

É possível realizar os sonhos de padrões estéticos. Contudo, de forma consciente. E sim, tanto o médico e o paciente possuem responsabilidades e direitos neste caso. O código de Bioética protege tanto o médico de suas próprias más escolhas, quanto seus pacientes.