Em pleno século XXI, o aborto é um dos maiores causadores de morte materna, articulando diversas posições e conflitos pessoais, culturais, religiosos e sociais. O aborto é designado pela lei como um crime. No artigo “A discussão política sobre aborto no Brasil: uma síntese”, Maria Isabel Baltar da Rocha declara que “segundo o código [penal], no capítulo intitulado "Dos Crimes contra a Vida", estão previstos como crime (e definidas penas) o aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento (art.124) e o aborto provocado por terceiros - sem consentimento da gestante (art.125) ou com seu consentimento (art.126). Está ainda previsto o aumento das penas nas situações de abortamento induzido por terceiros quando, deste ato, resultar lesão corporal de natureza grave ou morte da gestante (art.127). Por fim, um único dispositivo (art.128) dispõe sobre a não punição da prática do abortamento quando provocado por médico. Nesse caso, nas situações do denominado aborto necessário – se não há outro meio de salvar a vida da gestante – e do aborto de gravidez resultante de estupro”.
Existem três formas de aborto. O aborto espontâneo é ocasionado sem a intenção da mulher, pode acontecer por diversos fatores biológicos. O aborto induzido, que pode incorrer em má formação congênita, ocorre quando a gravidez resulta de um crime ou quando coloca em risco a vida da mulher; este não é crime de acordo com a legislação. O aborto ilegal é aquele praticado por motivos que não estão contidos na legislação. Pode acarretar a morte da mulher e é praticado na maioria das vezes pelas próprias gestantes ou em clínicas clandestinas.
Diante de todos os tipos de abortos que foram mencionados há ainda aquele que gera bastante discussão: os dos fetos anencefálicos, o que é ocasionado pela má formação rara do tubo neural, resultando na ausência parcial do cérebro ou da calota craniana (quando o cérebro não é coberto por ossos). Deste modo o feto não conseguiria sobreviver, vindo a óbito em um período curto. Segundo o Congresso Nacional os projetos que estão associados a este fato descriminalizam o aborto no caso de malformações congênitas.
A questão do aborto no Brasil é muito antiga e as leis relacionadas e este assunto foram formuladas nos anos 40 durante o período ditatorial do Estado Novo, que desde aquela época apontava o aborto como um crime. A legislação apresentada anteriormente mostra as diversas formas do crime e os atos que levam uma pessoa a cometer o aborto. A igreja católica teve forte influência nas questões sobre aceitar o aborto na sociedade e tem como opinião que o ato é um crime contra a vida e pecado até os dias atuais.
No campo ético, o aborto é um assunto que gera muita polêmica, e com isso se estabeleceram dois grupos principais: os Pró-vida, que reúnem pessoas que são contra a prática, e trazem argumentos como a banalização do aborto e da vida, além de problemas psicológicos. Já os Pró-escolha são os que estão a favor de uma legislação que descriminalize a prática, argumentando que tal atitude irá beneficiar a mulher e a sociedade no âmbito ético, com a diminuição de clínicas clandestinas, gastos do SUS (Sistema Único de Saúde) e o controle de natalidade.
Em meio a este mundo de conflitos a feminista francesa Gisã aponta uma opinião divergente perante muitos da sociedade. Segundo ela a questão do aborto deve ser opção total da mulher ela querer ou não abortar, pois durante muitos anos a humanidade vem questionando este assunto que envolve não só a vida, mas sim a moral e ética de uma sociedade. Ela aponta também que as mulheres deveriam ser livres para opinar esta questão, pois elas dão à luz e cabe a elas saber o que é melhor. Tendo assim uma contradição entre as sociedades.
Um outro artigo intitulado “Aborto no Brasil: uma pesquisa domiciliar com técnica de urna”, de autoria de Debora Diniz e Marcelo Medeiros, traz dados importantes sobre a temática. No artigo há indícios que mostram como mulheres de baixa renda são expostas à prática do aborto. Com tantas alternativas para que a gravidez indesejável não aconteça, mulheres ainda engravidam, e algumas respostas por que este ato acontece são: a falta de estrutura familiar, falta do conhecimento do uso de remédios como a pílula, que é adquirida em farmácias, ou o uso incorreto e sem consentimento de médicos destes medicamentos acabam levando à gravidez não desejada e à prática do aborto, mesmo sendo este um ato muito arriscado e violento para a mulher.
Neste mesmo artigo um outro estudo realizado pela Pesquisa Nacional de Aborto (PNA) chama a atenção. Este estudo fez um levantamento em domicílios realizado em 2010, cuja cobertura abrangeu as mulheres com idades entre 18 e 39 anos em todo o Brasil urbano. Mostrou-se que as mulheres de baixa renda também são as que praticam o aborto com frequência. Segundo o levantamento, após o final da vida reprodutiva já abortaram uma ou mais vezes.
O aborto é o responsável pela alta taxa de mortalidade materna segundo o Sistema Único de Saúde (SUS) e isso mostra que muitas mulheres estão realizando o ato clandestinamente. Ele pode ser feito pelas próprias gestantes, com medicamentos, utensílios inapropriados (como talos, agulhas de crochê, soda cáustica etc.) e em clínicas com pessoas sem formação alguma para a prática, além de pouca higiene.
Dados levantados pela Federação Brasileira de Sociedades de Ginecologista e Obstetrícia (FEBRASGO) mostram que a maioria dos médicos (Ginecologista e Obstetrícia) em muitos dos casos desconhecem os artigos contidos na legislação que trata do aborto, mesmo havendo uma minoria que sabem os procedimentos corretos ditados pela lei.
Em virtude do que foi mencionado, percebe-se que a sociedade brasileira precisa de mudanças, tanto na educação quanto na saúde. Os dados levantados pelas pesquisas mostram um índice muito elevado do aborto em mulheres de classe média baixa, evidenciando as implicações sociais do aborto.
Como estudantes, nós vemos que o conhecimento muitas das vezes é deixado de lado quando o assunto é a sexualidade, e é neste momento que podem surgir graves dilemas com doenças (como o HIV) e aborto.
O conhecimento obtido pelos médicos também deve ser fiscalizado, já que na maioria das vezes estes desconhecem a formulação correta da lei sobre o aborto. Outro fator é que existem várias divergências sobre aborto na sociedade, onde muitos assuntos precisam ser discutidos tanto em esferas religiosas quanto científicas para o benefício das muitas mulheres que sofrem com a prática do aborto no Brasil.