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Cérebro e Memória: Mistérios Elétricos

É muito difícil calcular qual a importância da memória para nós, humanos. Mas ela é muito grande. Se pensarmos em nossa história evolutiva, os nômades primitivos precisavam se lembrar de onde havia comida, água, riscos, abrigos e até mesmo as fisionomias, para identificar se aqueles que se aproximavam eram amigos ou inimigos. 

O desenvolvimento da memória se deu em conjunto do desenvolvimento cerebral em nossa espécie. E embora seja muito difícil entender o funcionamento de nossos cérebros, aos poucos, áreas de estudo como a neurociência têm nos ajudado a entendê-lo melhor.

 O cérebro é o centro de comando das funções básicas do corpo (pensar, perceber, se movimentar, falar) e é nele, com peso aproximado de 1 a 1,5Kg, aparência cinzenta e consistência parecida com polpa de abacate, onde se encontra a central elétrica da memória. 

A ponte liga o cérebro à coluna vertebral. Ligado à ponte, está o cerebelo, responsável pelas funções motoras. Acima da ponte está o tálamo, centro das emoções, e logo abaixo dele está o hipotálamo, responsável por manter a temperatura corporal, a composição química do corpo, entre diversas outras funções básicas, como a regulação do sono, da fome e do desejo sexual.

O telencéfalo, que reúne os hemisférios direito e esquerdo do cérebro, é de longe a sua maior região. Esta grande porção cerebral é responsável pelas funções complexas, entre elas a fala, a criatividade e a memória. O córtex cerebral, camada que reveste o telencéfalo, é a região mais importante para a memória. Sua disposição cheia de aprofundamentos (que fazem o cérebro ficar "enrugado") aumenta muito sua superfície, de modo a conter um maior número de células num espaço menor. Contém 75% das células cerebrais (neurônios), embora ocupe apenas 25% do seu volume. 

Os cerca de 10 bilhões de neurônios do cérebro se comunicam com outros neurônios através de prolongamentos chamados axônios (enviam os impulsos) e dendrites (recebem os impulsos), sempre que processamos uma atividade mental. É também nessas comunicações que se estabelecem as lembranças. Quando tentamos memorizar algo, alguns neurônios enviam impulsos elétricos formando um "circuito elétrico" cerebral.

 Cada neurônio pode ter centenas dendrites, contendo minúsculas portas chamadas sinapses, por onde entram mensageiros químicos enviados por axônios de outros neurônios. Cada tipo de mensagem possui mensageiros diferentes (a dopamina, por exemplo, inibe alguns movimentos, enquanto a seronotinia funciona como anestésico). As sinapses podem ser excitadoras, estimulando impulsos elétricos, ou inibidoras, impedindo que eles ocorram. A atividade nas sinapses é que regula nosso processo de memorização.

O cérebro é ainda revestido por membranas chamadas meninges (a conhecida meningite é uma inflamação neste local), com as funções de proteção e nutrição. Sem o fornecimento de substâncias específicas, como proteínas, enzimas, glucose e íons de cálcio, o cérebro não poderia elaborar os transmissores químicos. Esse incessante trabalho também exige grande suprimento de oxigênio para que os neurônios permaneçam vivos. Embora o cérebro represente apenas 3% de nosso peso corporal, chega a consumir 20% do suprimento de oxigênio. 

Apesar da complexa rede elétrica, o cérebro não funciona como um computador, como muitas pessoas pensam. Computadores processam informações em série (uma parte dos dados por vez), e as informações da memória estão em um local específico. O cérebro coordena diversos processos paralelamente, e um dado da memória pode ser recuperado de locais diferentes. O modo como o cérebro associa nossas lembranças e as distribui fisicamente é bastante complexo. 

Por isso, lembramos das coisas de modo estranho, e às vezes só parcialmente. Por exemplo, você pode se lembrar bem de uma conversa de que participou, mas não ter certeza de quem estava lá, porque o conteúdo foi arquivado num lugar associado a conversas e as pessoas num lugar associado a reuniões com amigos. Da mesma forma, você poderia se lembrar da situação com as pessoas sem se lembrar direito do que conversaram. 

Quando lembramos de alguma coisa, uma memória de curta duração é criada (ou recriada). Sinais elétricos causam alterações físicas na rede de neurônios, através de um padrão ultracomplexo de ação dos transmissores eletroquímicos. A atividade de um único neurônio poderia atravessar o cérebro por tantos caminhos diferentes que isso superaria a quantidade estimada de átomos em todo o universo.

 Dependendo de fatores diversos (atenção, estímulos repetidos, importância emocional) algumas dessas memórias curtas podem ser transformadas em memórias de longa duração, permanecendo no cérebro por mais tempo. Distração e fatores traumáticos podem afetar as redes de modo inverso. Situações traumáticas podem ficar incompletas na memória ou mesmo serem esquecidas, assim como eventos de estresse podem ser registrados de modo diferente de como realmente aconteceram. 

Mas uma coisa é certa. Quando se trata de memória, o estímulo é a chave do sucesso. Quanto mais treinamos nossa memória, mais eficaz ela se torna. Hoje existem diversas técnicas de memorização, que visam estimular o cérebro de formas diferentes sobre um mesmo fator, fazendo com que ele seja lembrado mais facilmente e de mais formas possíveis. 

O funcionamento real da memória ainda é um mistério, mas estamos caminhando para compreendê-la melhor. Se por um lado, nossas memórias nem sempre são tão confiáveis, por outro já é sabido que memórias estimuladas fazem com que as redes eletroquímicas estabeleçam mais sinapses e de maior tamanho, tornando essa memória mais confiável e de melhor acesso.

 A memória hoje é até mesmo objeto de competições. Dominic O'Brien, autor do livro "Aprenda a usar a Memória", ganhou 8 vezes o campeonato mundial de memorização. Assim como ele, todos temos potencial para desenvolvermos nossa memória a níveis que parecem inacreditáveis.

 Mas a função da memória não é apenas competir. Ela é importante para termos uma vida mais completa, pois dominar a "arte de memorizar" nos ajuda a aprofundar o conhecimento do mundo, absorver mais informações, ser mais eficientes no trabalho e até mesmo tornar os relacionamentos mais harmoniosos.

André Luiz de Camargo Estevam – 6º ano de Ciências Biológicas







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